domingo, 12 de abril de 2009

O Passeio

"Até pensei que era mais
Por não saber que ainda sou capaz
De acreditar
Me sinto tão só
E dizem que a solidão até que me cai bem

Às vezes faço planos
Às vezes quero ir
Pra algum país distante
Voltar a ser feliz..."

Legião Urbana, "Maurício"

Ontem de noite eu andava e ouvi os meus passos. Então percebi que eu era eu e somente eu e que também estava sozinho. Era tarde e eu não sabia o que se faz quando se descobre que se está sozinho, então parei, olhei para os lados e me escondi perto de uma árvore numa dessas rua desertas, porque pior que estar sozinho é deixar que os outros saibam disto. Eles sempre sabem e eu escondo o horror de tudo isso, eu uso luvas, eu uso capa, chapéu, eu me transmuto no Homem Invisível para que deixem em paz minha solidão secreta que não é secreta e, enfim, o tempo passa. Outro dia vi umas crianças na saída do colégio, correndo para a banca de jornais para comprar as novas figurinhas, com as moedinhas do lanche que esconderam pela semana. E eu sabia disso e sorri pra mim mesmo, não esbocei sorriso porque não esboço sorriso pelas ruas, seja lá porquê motivo, mas sorri por dentro em simpatia, apesar de nem as figurinhas, nem as revistinhas, nem os papos, nem o jogo de bafo, nem os desenhos e nem as músicas sejam as mesmas dos meus tempos de guardar moedas para comprar figurinhas. E então, não tenho universo. Estou escondido atrás da árvore da rua que não sei o nome, deserta e a noite, diferente do meu espírito, é quente, e eu estalo os dedos pro tempo passar, porque tenho medo de voltar pra onde quer que seja e de ir pra qualquer outro lugar. Eu estalo os dedos e as imagens aparecem, porque é sempre assim, uma coisa leva a outra, uma imagem que leva a um pensamento que leva a uma lembrança que não se quer lembrar ou à lembrança forjada que tanto se quis e nunca existiu. E eu, de capa e chapéu, levanto e de repente fica tudo tão bonito e eu quero correr pra ti e te abraçar como nunca antes, dizer que te amo e que nunca quero ficar longe de ti, mas é tudo mentira e eu sinto o êxtase no nada, no pó da rua deserta onde estou perto da árvore, sozinho. Eu olho as janelas dos apartamentos ao redor e todos estão ocupados com suas pizzas de fim de semana, seus filmes de fim de noite, suas contas que vão vencer. E eu grito: Vocês amam? Mas são covardes e não me respondem, não se dão conta, querem amar sua imagem de amor ao invés de amar o ato de amar. Eu cansado estou de não ser o que querem que eu seja. Eu não sei se sou o que quero ser e nem o que quero ser. Eu só queria uma fotografia de alguém que já me foi importante, que ela caísse do céu como uma milagre daquele que nunca se manifesta, queria guardá-la no meu casaco e deitar junto da árvore onde me escondi até que a vida de mim expirasse, mas eu não posso porque eu ainda estalo os dedos. Talvez eu ainda transe essa loucura.

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