segunda-feira, 29 de setembro de 2008

Se Existiam Deuses... Eram Eles Astronautas?


"Há muitas moradas na casa de meu Pai; se assim não fosse, já eu vo-lo teria dito, pois me vou para vos preparar o lugar. Depois que me tenha ido e que vos houver preparado o lugar, voltarei e vos retirarei para mim, a fim de que onde eu estiver, também vós aí estejais." ~ São João, Cap. XIV, vv. 1 a 3.

Há pouco tempo terminei a leitura de "Eram os Deuses Astronautas?" de Erich von Däniken. Lançado em 1968, tornou-se um dos grandes best-sellers com mais de 40 milhões de cópias em todo o mundo. E embora eu sempre torça o nariz para os best-sellers, tanto ouvi falar de Däniken - de gente que diz que o livro mudou suas vidas, a quem afirma que Erich não passa de um picareta - que tinha de lê-lo.

Apesar dos mistérios abordados me fascinarem, a leitura não me impressionou. De fato, não o considerei sensacionalista, o que poderia explicar as vendas espetaculares - esperava algo que beirasse ao religioso, como a ufologia mística -, mas talvez suas afirmações, não tão polêmicas 40 anos depois, fossem extraordinárias para 1968, era pré-internet sem informações expostas ao grande público e de fácil acesso, além do início da onda ufológica no mundo.

Erich von Däniken elabora uma, verdadeira ou não, interessante teoria sobre o misterioso passado humano na Terra. Segundo ele, possivelmente, seres extraterrestres estiveram em contato com civilizações como a egípcia e a maia. Sua argumentação se sustenta em fatos peculiares e ainda assombrosos, como o posicionamento das três pirâmides de Gizé no Egito, que é proporcional às estrelas da constelação de Órion - estrelas conhecidas no Brasil como "As Três Marias". A circunferência da pirâmide de Quéops que, dividida pelo dobro de sua altura, tem como resultado o célebre número de Ludof, Pi = 3,14159. Um meridiano que passe pelo seu centro divide continentes e oceanos em duas metades exatamente iguais. Aliás, a própria construção das pirâmides em si é extraordinária. Ainda hoje, não se sabe como foram construídas nem o método usado. Como teriam os egípcios realizado construções de tal porte e com tamanha precisão astronômica?

Os maias também construíram pirâmides e tinham alguns conhecimentos fantásticos. Sabiam que a Terra demora 365 dias para girar em torno do sol. Seu lendário calendário data, com perfeita exatidão, todos os eclipses e eventos solares até o ano de 2012! Outro mistério citado é o dos mapas do pirata Piri Reis, integrantes de sua obra Bahyre, publicada no século XVI. Segundo ele, os mapas foram realizados a partir do estudo de todas as cartas existentes de que tinha conhecimento, algumas "muito antigas e secretas". Foram redescobertos nos anos 20, mas o caso só veio à tona nos anos 50. O mapa apresenta, com exatidão, a Cordilheira dos Andes e até o Rio Amazonas, áreas até então inexploradas! Contém também a Antártida, suposto continente perdido e um dos maiores mistérios da humanidade. Como poderiam tais mapas serem realizados sem o auxílio de um veículo aeromotor?

Picareta ou não, Däniken intriga e, ao seu favor, admite apresentar apenas uma teoria não-comprovada. De fato, assim como extraterrestres podem ter auxiliado no desenvolvimento de tecnologias humanas, um inteligente coelho gigante vindo de uma suposta civilização intra-terrena de Vênus poderia também fazê-lo, não é mesmo? Em realidade, talvez a comoção maior de Astronautas seja causada pelo completo ou parcial desconhecimento das pessoas sobre os próprios mistérios assim como sobre as civilizações antigas (e aqui este autor se inclui). É muito mais fácil manipular teorias sobre um assunto o qual a humanidade não têm conhecimento completo (a civilização mesopotâmica, por exemplo), ainda mais quando o pouco conhecimento que se tem não é exatamente um lugar-comum na cabeça do público em geral, sendo fácil deste modo exercer um fascínio sobre algo que já é misterioso. Dan Brown é o maior expoente disto em nossos tempos.

Agradável, no entanto, foi meu contato com este fenômeno da cultura pop. Que venha agora Caio Fernando Abreu!

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Êxtase Brandoniano

É notória a minha insatisfação com a cidade de Santos. Culturalmente, pouco (se quase nada) me atrai. Invejo São Paulo com suas salas de cinema alternativas que exibem Wilder, Bergman, Fellini e estrelas como Monroe, Garbo e Davis como algo rotineiro. Com este sentimento iniciei a segunda-feira do dia 15. E com uma pitada de raiva também.

Navegando pela Folha Online descobri, em destaque, que filmes raros do grande Ingmar Bergman serão exibidos na Mostra de Cinema de São Paulo deste ano. Como tudo que é bom nunca chega a esta província-wannabe-metrópole, claro que não me espantou. De fato, seria um feito extraordinário se um evento deste porte sequer chegasse perto de Santos (embora que, Deus saiba lá por que, Dionne Warwick, que já pisou nos palcos do Madison Square Garden, esteve duas vezes a fazer shows há poucas ruas de minha casa no último ano).

A indignação porque não terei a experiência única de assistir Bergman no cinema transformou-se em curiosidade. Será que Santos nada tem de interessante a Vilângelo ou Vilângelo que, por não ter interesse em Santos, não sabe se há algo interessante de fato? E em tal questão hamletesca, dirigi-me destemidamente ao Google em busca de desbravar os supostos recantos da boa cultura na minha tão lamentavelmente tediosa cidade. Eis que fiz um excelente, se não quase surreal achado: o Museu de Imagem e Som de Santos.

O MISS está localizado no Teatro Municipal da cidade e, quem conhece o local, certamente compreenderá do que falo (sim, toda vez que tal Teatro vem a minha cabeça só consigo pensar em como o local é feio e mal-cuidado). O MISS não é nenhuma evolução neste sentido. Pouco pude ver do museu em si, que abriga milhares de LPs (entre eles, o primeiro álbum de Elvis Presley e um dos primeiros de Little Richard). Há uma mensagem no site dizendo aos visitantes que é permitido gravar os LPs em fitas K7 para se levar pra casa (pergunto-me se há ironia nisso mas, ao descobrir que a grande maioria dos filmes exibidos no auditório deles é em VHS, reservo-me ao direito de ficar calado).

Mas eis que pulo o momento maior da extraordinária descoberta do MISS. O descobri ao saber que Sindicato de Ladrões, uma das obras máximas do genial Elia Kazan, com uma performance definitiva e histórica de Marlon Brando, seria o filme exibido na "Sessão Retrô" do auditório deles, que acontece todas as segundas-feiras há anos! Sim, mais tarde, ao pesquisar, descobri que, por anos, perdi exibições de Gene Kelly, Cary Grant, Bette Davis, Laurence Olivier, Fred Astaire, Marlene Dietrich, Ingmar Bergman, Federico Fellini e tantos outros... e ainda por cima de graça!

Havia já estabelecido certa programação para o dia, mas quem se importa com o que quer que há de ser feito quando se pode assistir Marlon Brando na silver screen? Bastou-me persuadir alguns amigos, e já estava a caminho de tal glorioso momento!

Como comentei sobre a precariedade das instalações do Teatro Municipal, aqui falo sobre o auditório do MISS: as cadeiras, embora estofadas, não eram de fato confortáveis, o aroma da sala não era dos melhores e, sendo sessão grátis, considerável parte do público era constituída pelos mendigos dos arredores que, obviamente, em nada ajudaram na melhoria do odor da sala. A minha cópia do filme em VHS (gravada da TV) era também infinitamente superior à exibida, que deve ter sido algum relançamento oitentista de clássicos em vídeo que, Deus lá sabe como, não embolorou. Mas não reclamemos da boa cultura dada de graça!

Até porque nenhum empecilho merece menção quando surge ele, imenso na tela, um Deus mítico do cinema... Marlon Brando! Como envolto num sonho louco, desses de extrema felicidade e realização aos quais, ao acordarmos, cinzentamente constatamos que apenas no mundo dos sonhos poderia ter acontecido. Mas eu vi ele! Eu vi o Marlon Brando no cinema, como já havia visto várias vezes no meu televisor, como milhares de pessoas viram em sua estréia original, em 1954! E em um dos maiores filmes de Elia Kazan, mestre da direção em clássicos como Vidas Amargas com Jimmy Dean e Uma Rua Chamada Pecado, com Vivien Leigh e o próprio Brando!

Sindicato de Ladrões
, filme do ano no Oscar de 1955, começa com a morte "encomendada" de um grevista, de certa forma ajudada por Terry Malloy, personagem vivido por Brando. Terry, que costumava ser lutador de boxe, trabalha agora no porto para Johnny Friendly, o chefão corrupto do sindicato. Em realidade, Terry não trabalha, ganha grana fácil e executa os trabalhos mais simples... em resumo, é um "vagabundo" (e aqui temos uma das frases mais memoráveis do trabalho de Brando no cinema. Em uma cena com seu irmão, Terry diz: "Você não entende! Eu poderia ter sido um lutador! Eu poderia ter sido alguém! Ao invés de um vagabundo, que é o que sou!"... e o filme atinge seu ápice com a morte do irmão de Terry). A irmã do grevista morto, interpretada por Eva Marie Saint, recusa-se a retornar a escola enquanto não descobrir quem matou seu irmão. Um padre (interpretado por Karl Malden), a ajudará em realizar tal descoberta. Terry Malloy e Edie (Eva Marie Saint) se apaixonam e... será que Terry vai revelar o que sabe? Quando seu irmão é morto, ele decide-se a acabar com o império de Friendly. Não revelarei o final para futuros apreciadores da obra de Kazan, mas não devemos ignorar e ao menos mencionar a beleza simbólica da cena final!

Brando brilha na performance de uma vida (provavelmente a maior performance de Brando, seguida por Uma Rua Chamada Pecado... sim, nunca fui entusiasta de O Poderoso Chefão!), onde cada movimento e cada palavra sua na tela são manifestações estásicas de um talento raro e extraordinário que, em sua legitimidade, contagia-nos também com seu êxtase de expressar!

Ao final da película, meus olhos ainda custavam a digerir a grandeza do momento que haviam presenciado! E eu retornei ao meu mundo caseiro como quem é agraciado com um milagre... "Eu vi Marlon Brando! Eu vi Marlon Brando! Eu vi Marlon Bando!" Ao anoitecer, esvaziei a minha mochila e percebi que haviam levado minha carteira, com todos meus documentos, cartão do banco e dinheiro retirado e vislumbrado por tão pouco tempo, certamente no ônibus lotado a caminho do paraíso Brandoniano. Mas tudo bem. Por ele eu faria tudo isto novamente!

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

O Octênio da Repetição

"Vou seguindo pela vida
Me esquecendo de você
Eu não quero mais a morte
Tenho muito que viver

Vou querer amar de novo

E se não der não vou sofrer

Já não sonho

Hoje faço com meu braço o meu viver..."


Milton Nascimento, "Travessia".


O Octênio da Repetição
Bruno Vilângelo

À vedada tez:
Por tanto tenho o rubro do olhar
Minha chapliniana máscara de pantomima cansada
Desatinada
De longínquia estar a ventura
Que os sentidos já há tanto anseiam

A ostentar na languidez dos passos
Desonra inconfessável
Que cesso em escutá-los e existí-los: não os quero mais
Destemidez sou agora
Em sinuosas lembranças de outrora

E quando nos passos mudos e prostrados
Confronto a crueza nua destes degraus
Não mais quero que vejam minha'lma
Em lancinante putrefação

A mim e à minha fortaleza perdida
Estou certo ao subir nestes passos prosaicos
Que, por tanto tempo
Crescer de nada adiantou
Meu imutável intrínseco de sofrer...
Nada mudou.