sexta-feira, 29 de agosto de 2008

E Então Começava 1983...

"Michael Jackson, por que custou tanto a aparecer Michael Jackson? Os deuses desapareceram há milênios, o grande Pã morreu ninguém se lembra mais quando. As religiões, sentindo-se solitárias, abraçaram-se ecumenicamente, pórem nenhuma apresentou um fato novo, de importância cósmica. Foi preciso que um útero... Não. Michael Jackson, o divino, nasceu da barriga de um meteoro ou da pura luz ou das entranhas do Fatum. Tinha que nascer diferente, para crescer diferente e seduzir diferente a humanidade. O disco de MJ substitui plenamente as Epístolas de São Pedro, São Paulo e São Tiago, e até a novela das 8. Colossenses, Tessalonicenses, Coríntios (e corintianos também), detende-vos e escutai a Voz que vem de Michael. A voz e os gestos. Escutai os gestos, as lantejoulas pretas, a cabeleira incendiada no comercial de tevê, escutai o lobisomem em que ele se transformou."
Carlos Drummond de Andrade, Jornal do Brasil, 19/07/1984.

Alguns momentos glorificam as carreiras de todo grande talento. O gol impossível, a atuação impecável. Michael Jackson já tinha tudo isso e muito mais em 1982. Ele já era, em realidade, um superstar internacional. Contava já com seus trunfos da infância - a icônica imagem que temos na cabeça dele, menininho, com seu grande afro e seus quatro irmãos, entretendo multidões com seus ABC, I Want You Back, I'll Be There e tantos outros sucessos - e com a recente consagração do álbum Off The Wall, disco este que no início dos anos 80 já liderava como o mais vendido por um negro em toda a história da indústria fonográfica. Jackson, no entanto, não ficou satisfeito. A tal premiação Grammy indicou Wall para apenas duas categorias, o que o deixou extremamente desapontado. Sua resposta mental para tal esnobismo da premiação, como registrada no livro Moonwalk, seria a profecia mais acertada da história da indústria fonográfica: "O próximo eles não vão poder ignorar".

Quando Michael Jackson retornou com um novo LP nas lojas em 1º de dezembro de 1982, recebeu críticas favoráveis. Esperava-se que o disco vendesse consideravelmente bem, embora muitos executivos duvidassem de um sucesso à lá Off The Wall, que já era recorde. A estratégia de lançar o compacto de The Girl Is Mine antecipadamente surtiu efeito: nos Estados Unidos, o dueto com Paul McCartney chegou ao no. 2 entre as 100 mais tocadas, recebendo disco de platina por 1 milhão de cópias vendidas. Com isto, Thriller já catapultou imediatamente para a 11ª posição dos 200 discos mais vendidos em solo norte-americano, segundo a Billboard.

E então começava o ano de 1983. Depois dele, nada mais seria o mesmo no mundo do entretenimento, na indústria fonográfica, na recém-criada MTV, nos noticiários, nas revistas de fofoca, nas conversas de salão, no recreio da escola... pois ele, na verdade, agora era Ele. Michael Jackson tomou o ano de 1983 para si e sua grandeza, e nele deixou de ser apenas um superstar: ele era agora o superlativo Deus-mítico da cultura pop.

O Big Ben começou em janeiro de 83: era lançada nas rádios o segundo single do novo disco de Jackson, Billie Jean. Com uma extraordinária batida, a letra revelava um Michael suplicante em explicar que Jean não era sua amante e que seu bebê não era seu filho, um manifesto musical que invadiu as pistas de dança e se consagrou como o maior sucesso de sua carreira: foram 7 semanas em primeiro lugar na terra do Tio Sam e 6 meses entre as 100 mais tocadas, rendendo a ele mais um disco de platina pelo single. Grande parte do seu sucesso pode ser atribuído a outro fator da conquista-Jackson de 1983.

A MTV era um canal com pouco mais de 2 anos de idade quando Michael emplacava os hits de Thriller. Especializada em exibir videoclipes, apresentavam também uma restrição: não exibiam videoclipes de artistas negros. Eles seriam obrigados a quebrar sua política racista em pouco tempo. Michael Jackson, encantado com o formato do videoclipe, levou-o a outro patamar. Billie Jean foi provavelmente o primeiro clipe roteirizado da história, e suas cenas marcantes - o chão que acendia com a magia da dança de Jackson - atreladas ao grande hit do momento marcaram com grandeza o início da Michael-mania em todo o mundo.

O próximo compacto, Beat It, não tardou a ser lançado. Chegou às lojas em fevereiro e escalou lentamente até chegar ao top 10 da Billboard (onde permaneceu por 10 semanas) e ao topo do chart por 3 semanas consecutivas. Michael Jackson agora igualava o sucesso de Thriller ao de Off The Wall: ambos emplacaram dois singles em #1 na parada americana.

Sua escalada ao posto de Deus do Pop teve outro ponto crucial em Beat It: seu segundo videoclipe. Nele, Michael esbanja energia ao impedir o confronto de duas gangues rivais e promover uma grande dança coletiva. Com Billie Jean e Beat It, Michael Jackson popularizou mundialmente o formato do videoclipe que seria agora um fator indispensável na campanha promocional de todo artista pop/rock. Conseqüentemente, a conquista da MTV como canal se deveu justamente ao pioneirismo artístico de Jackson.

Em 16 de maio de 1983, Michael Jackson dava seu penúltimo passo em direção ao mito de si mesmo: foi a noite em que milhões de americanos acompanharam uma das maiores performances da história da dança. O evento foi o Motown 25, show que comemoraria os 25 anos da gravadora Motown com apresentações de vários artistas, incluindo de Michael Jackson como membro do The Jacksons. Ao término da performance com os irmãos, Michael exorciza o seu passado - "Estes foram os dias antigos. Eu realmente amo essas canções..." - e dá o passo em direção à sua glória de mito-mor da história do entretenimento - "Mas o que eu gosto mesmo são as músicas novas" -; começavam as batidas de Billie Jean e Michael, movendo-se ferozmente, incultaria no inconsciente popular sua imagem mágica, misteriosa e fascinante, com um popismo comparado apenas ao de Carlitos: sua luva brilhante, meias reluzentes, sapatos mocassim, o chapéu preto... todos componentes da força sobrenatural que, naquela noite, aterrorizou 50 milhões de lares com sua inexplicável genialidade. No meio da apresentação, como se flutuasse pelo ar, Michael oficiamente se transforma em mito ao realizar seu "moonwalk". No dia seguinte, o mito recém-nascido é reconhecido pelos mitos a quem admirava: Fred Astaire liga para Michael Jackson e diz que gravou sua apresentação e assistiu-a duas vezes pela manhã. "Você é uma dançarino infernal, Michael!", disse um dos maiores expoentes dos filmes musicais. Mais tarde, ele e Gene Kelly dariam uma "passada" na casa de Michael para "baterem um papo".

Michael Jackson era agora maior do que a vida. Assim como Thriller. Neste momento, o álbum firmou-se em no. 1 entre os 200 mais vendidos nos Estados Unidos, onde permaneceu por 17 semanas consecutivas. Depois, oscilaria entre a segunda e terceira colocação, retornando novamente ao topo, onde permaneceria por mais 20 semanas, totalizando 37 semanas - 9 meses e 1 semana! - como o disco mais vendido no mercado mais importante da indústria fonográfica! A ânsia por Michael Jackson, que vendia 1 milhão de "Thriller"s por semana só em seu país, fez com que até Off The Wall, disco de 79, retornasse timidamente aos 200 mais vendidos, até conquistar uma respeitável posição #44, adicionando 49 semanas ao seu chart-run americano.

E o enluvado bombardeava as rádios, criando hits Top 10 instantâneos: Wanna Be Startin' Something (a base para o hit-mor de 2008, Please Don't Stop The Music), Human Nature e P.Y.T. (Pretty Young Thing).

Ao término do ano, Jackson conquistaria mais um hit no. 1 com o lançamento de seu dueto com Paul McCartney para o álbum deste: Say, Say, Say. A faixa ganharia ainda um videoclipe com ambos, mas nada perto do que estaria por vir.

A CBS, gravadora de Jackson, satisfeita com os lucros astronômicos e imprevisíveis gerados pela adoração em massa à Thriller, recusou-se a financiar o próximo - e último - videoclipe do projeto. Michael Jackson então desembolsou 500.000 dólares e contratou John Landis, o diretor de Um Lobisomem Americano em Londres.

Em 2 de dezembro de 1983, a MTV - que, desta vez, pagou pela exibição - exibia Thriller, o curta-metragem de 13 minutos pelo qual Michael Jackson estaria sempre associado, sua última empreitada mítica do ano de 83. Um tributo aos filmes de horror, Jackson nos brinda com um dos momentos mais inesquecíveis já colocados em filme: sua namorada, procurando uma forma de fugir dos mortos-vivos que os cercam, olha para Michael e percebe que ele também é um! A sequência de dança que se segue é um irresistível e único momento da cultura pop; é a coreografia que todos nós, em qualquer parte do mundo, podemos identificar como a que consagrou o curta-metragem de Thriller! Como Jackson bancou os custos da obra, pôde ver seu investimento dar frutos com o lançamento do home-video The Making of Thriller, até 1988 o home-video mais vendido de todos os tempos, com 9 milhões de cópias comercializadas (o recorde foi apenas batido por Moonwalker... home-video do próprio Michael Jackson)!

Em 1 ano, Michael Jackson popularizou algumas das canções mais memoráveis da história da música pop, redefiniu o conceito de videoclipe, inovou a dança com surpreendente genialidade e cruzou a linha entre mortais e deuses, transformando-se para sempre em um ícone inigualável da cultura popular nos séculos XX e XXI.

Em 1984, Michael colheu os louros de Thriller ao ganhar 8 prêmios Grammy, vingando-se finalmente da premiação. Envolveu-se no famoso acidente do comercial da Pepsi, onde sofreu queimaduras no couro cabeludo, e percorreu cidades americanas com Victory, sua muito-celebrada turnê com os irmãos. Recebeu 20 discos de platina por Thriller nos Estados Unidos e uma homenagem oficial do Guiness Book, que introduziu Michael Jackson e seu Thriller como o álbum mais vendido da história da música!

Hoje Michael Jackson, a quem tanto amo por sua pessoa extraordinária, completa 50 anos e a ele aplaudemos por agraciar nosso mundo com a beleza de seu talento extraordinário! Em 2008, comemoramos o 25º aniversário do ano que mudou a carreira do Rei do Pop e vislumbramos a vitalidade da sua obra, que atravessa décadas sem perder a essência da supragenialidade daquele menino de Indiana, que ainda encanta a quem, boquiaberto, assiste ao seu "moonwalk" pela primeira vez ou aos seus videoclipes visionários!

A edição especial de Thriller, lançada no início deste ano, é um dos álbuns mais bem-sucedidos de 2008. Em tempos de download, o disco de 25 anos ultrapassou as 2 milhões de cópias vendidas sem qualquer dedo de Michael Jackson na publicidade do mesmo. Suas vendas ultrapassaram até mesmo os lançamentos de Mariah Carey e Usher, considerados dois dos maiores popstars do momento, e Jackson se encontra apenas pouco mais de 500.000 cópias atrás de Madonna que, em seu usual aparato de marketing, já conta com dois singles/vídeos no mercado e uma turnê mundial para apoiar seu álbum. É evidente a imensabilidade do impacto de Michael Jackson e seu talento, tão fortemente cravado em nossa cultura que nem sua imagem altamente difamada midiaticamente pôde arruinar.

"A grande música dura para sempre,"
Michael Jackson disse em uma entrevista há três anos atrás. Sua obra nos prova isso, a cada dia mais. Parabéns Michael pela grandeza da sua pessoa e do seu talento! São seres humanos como você que iluminam nossos corações e nos ensinam os verdadeiros valores desta vida. Este é o legado que teremos orgulho em preservar!

2 comentários:

Unknown disse...

Parabéns, Bruninho! Seu texto apresenta muito bem a história a quem não a conhece e arrepia quem a sabe de cor, mas sempre quer relembrá-la!
Beijão
Andrea

Nathaly Brenner disse...

"A grande música dura para sempre". O que dizer quando MJ já disse tudo em apenas uma frase? hihihi
Seu texto está muito bom, como disseram, sempre bom relembrar essa grande história! :)

Beijos!
Nathaly